O relato abaixo foi encaminhado por email para este blog. Nele observamos a situação extrema que o Poder Público local e estadual está exercendo sobre os moradores do 5º Distrito. Estarrecidos com o relato só resta a pergunta: até quando isso prosseguirá?
xxx--------xxxxxx-----------------------xxxxxxxxxxxxxxxx
Ainda sob
efeito do choque e quase sem forças, tento registrar os crimes de
violação de direitos humanos que aconteceram hoje (13/03/2012) contra os
pequenos agricultores do 5º distrito de São João da Barra e que
presenciei alguns.
Às 6 h da
manhã o primeiro sítio teve sua casa e plantação demolidas. Quando o
agricultor chegou não havia o que fazer. Desesperado, sem notificação
prévia... ele foi algemado e levado para a Delegacia.
Dando
continuidade aos desmandos - que contam com grande força policial e com
agentes à paisana “armados até os dentes” – oficiais de justiça se
dirigiram para o sítio do Sr. Totonho, um sítio que Ele cultiva desde
menino e que até ontem ele alimentava fartamente com frutas, milho e
verduras a comunidade e, os amigos que lá chegavam. Sr. Totonho, um
sábio camponês, idoso, que tem na “palavra dada”o compromisso selado,
constrangido e coagido assistiu à destruição de sua roça de milho,
maxixe, abóbora e de suas fruteiras centenárias. Imediatamente à imissão
na posse, as máquinas entraram no sítio e o mesmo, vigiado pela força
da PM durante todo o dia ganha uma vala ao redor. Destruíram em poucas
horas o que uma família camponesa levou décadas para construir embaixo
de sol e chuva. Como diz Sr. Totonho: eles querem deixar tudo virar
“areia branca”.
Durante o dia
de hoje e ao longo do processo de “desapropriação”, que tem se
caracterizado por expropriação e esbulho, presenciamos a Constituição
Estadual/RJ ser desrespeitada pelo próprio Estado. Os artigos abaixo
foram violados, social e ambientalmente.
Art.
265 - Os projetos governamentais da administração direta ou indireta,
que exijam a remoção involuntária de contingente da população, deverão
cumprir, dentre outras, as
seguintes exigências:
I
- pagamento prévio e em dinheiro de indenização pela desapropriação,
bem como dos custos de mudança e reinstalação, inclusive, neste caso,
para os não-proprietários, nas áreas vizinhas às do projeto, de
residências, atividades produtivas e equipamentos sociais;
II
- implantação, anterior à remoção, de programas socioeconômicos que
permitam às populações atingidas restabelecerem seu sistema produtivo
garantindo sua qualidade de vida;
III
- implantação prévia de programas de defesa ambiental que reduzam ao
mínimo os impactos do empreendimento sobre a fauna, a flora e as
riquezas naturais e arqueológicas.
Art. 266 - O Estado promoverá, com a participação dos Municípios e das comunidades, o zoneamento ambiental de seu território.
§
1º - A implantação de áreas ou pólos industriais, bem como as
transformações de uso do solo, dependerão de estudo de impacto ambiental
e do correspondente licenciamento.
§ 2º - O registro dos projetos de loteamento dependerá do prévio licenciamento na forma da legislação de proteção ambiental.
§
3º - Os proprietários rurais ficam obrigados, na forma da lei, a
preservar e a recuperar com espécies nativas suas propriedades.
Os
agricultores despejados não tiveram pagamento prévio, não têm noção de
onde irão “restabelecer seu sistema produtivo garantindo sua qualidade
de vida”, pelo contrário, estão perdendo o gosto pela vida sendo
constrangidos com a ação da polícia militar, homens armados que o fazem
sentir verdadeiros bandidos. Imagine vocês: um camponês que compra na
venda sem assinar nada e paga fielmente suas contas, que enfrenta boi
bravo, seca, enxurradas, e uma vida familiar fértil de alimentos sendo
tratado dessa forma?!
Além
das condições de vida digna estão retirando desses agricultores sua
condição de existência e outros bens que são de ordem imaterial, como
por exemplo a derrubada de uma árvore que foi plantada por quatro
gerações passadas, e a infertilidade do solo (através da salinidade de
areia branca do mar que está sendo despejada em todo canto), que também
foi cuidado durante várias gerações e tornou-se uma terra onde “corria
leite e mel”.
Acompanhando
a terceira “desapropriação” do dia encontramos um agricultor de 69 anos
de idade. em seu processo consta "Réu Ignorado", apesar do mesmo
declarar que tem os documentos da terra, que procurou a justiça para
dizer que é o dono mas que permanece como ignorado. Em sua terra criava
algumas cabeças de gado e peixe. Quando chegamos, impedidos de entrar no
sítio pela polícia militar descobrimos que a Imissão na Posse não foi
entregue pelas oficiais de justiça ao pequeno agricultor. Além do tanque
de peixe que já estava sendo enterrado, vários cavaleiros tentavam
laçar o gado, fato que o assustou fazendo romper as cercas, só sendo
alcançado três.
A
oportunidade de falar com um dos cavaleiros, que portava um rádio de
comunicação igual ao do funcionário da CODIN, revelou que eles não têm
carteira assinada, que recebem um telefonema de uma pessoa e vai lá e
fazem o serviço mas não sabem para quem trabalha. O representante da
CODIN disse que não sabe para quem os cavaleiros trabalham e a oficial
de justiça afirmou o mesmo, apesar dos representantes da Comissão de
Direitos Humanos da ALERJ perguntar: os cavaleiros estão participando da
ação de desapropriação? Sim.
Porém,
ninguém soube dizer qual firma os contrata “clandestinamente”, como se
diz por essas terras. Os agricultores chegaram afirmar que havia
crianças como cavaleiros e que espalharam o gado aleatoriamente, sem
nenhum preparo. Poderíamos nos perguntar. Ora, que importância tem esse
fato? O gado representa uma ferramenta de trabalho, não é um animal
doméstico e sim ele gera sobrevivência desses camponeses.
Durante
o dia, três despejos. Os camponeses, dois deles idosos, perguntaram:
que Justiça é essa? Que lei é essa que só favorece os grandes?
Chegaram logo à conclusão que o poder econômico do Sr. X, em São João da Barra está implantando uma terra sem lei.
Até quando?
Ainda
temos esperança que diante de tantos crimes de violação de direitos
humanos e ambientais e, desrespeito às constituições estadual e federal a
Justiça será feita e, os camponeses e camponesas descobrirão a força
que têm, da mesma forma que hoje os bois descobriram a sua, quando
romperam “as cercas que os perseguiam” em uma operação desumana!